Planos de saúde estão comunicando aos seus segurados que os contratos serão rescindidos, mesmo sem justo motivo – e essa postura pode ser abusiva e ilegal.
Infelizmente, tem se tornado comum nas últimas semanas que os planos de saúde enviem comunicados aos seus clientes informando que irão rescindir os contratos de seguro-saúde – a grande maioria deles na modalidade empresarial – com diversas alegações genéricas e infundadas.
Numa tentativa de tentar passar uma ideia de ser uma situação legal, os planos de saúde estão estipulando um prazo para o fim do contrato, e se dispondo a oferecer “cartas de permanência”, que é um documento que permitiria que o usuário fosse para outra operadora sem a necessidade de cumprimento de carência. Assim, os planos de saúde estão rescindindo os contratos unilateralmente.
A rescisão unilateral do contrato ocorre quando a operadora do plano de saúde decide encerrar o contrato sem o consentimento do usuário. Essa prática pode gerar sérios problemas para esses usuários, como a interrupção do acesso a serviços médicos essenciais, a paralisação de tratamentos que estão em curso, e a dificuldade para obter novos médicos e clínicas conveniadas e aptas a atendê-los.
Acontece que essa é uma postura que pode ser considerada por abusiva e ilegal, pois visa “limpar” a base de clientes das operadoras, de forma a encerrar aqueles contratos tidos por mais onerosos. Boa parte dos usuários que recebem os avisos de rescisão estão sendo submetidos a tratamentos, ou possuem dependentes nesta condição.
É importante destacar que o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é o de que, mesmo nos planos coletivos, se o paciente estiver sendo submetido a algum tipo de tratamento, o plano é obrigado a garantir a continuidade do contrato no mínimo até que não seja mais necessário o acompanhamento, desde que o paciente continue pagando a mensalidade. Nesses casos, o plano só pode ser cancelado em caso de fraude ou de inadimplência.
Portanto, os usuários de planos de saúde contam com uma proteção legal contra a rescisão unilateral injusta. A lei 9.656/98, que regulamenta os planos de saúde, estabelece que a operadora só pode rescindir o contrato nos casos previstos em lei, como inadimplência por período superior a 60 dias consecutivos ou fraude por parte do usuário.
O usuário tem o direito de exigir a continuidade do contrato e o acesso aos serviços médicos contratados, desde que esteja em dia com suas obrigações financeiras. A rescisão injusta por parte da operadora pode ser considerada abusiva, e o usuário pode buscar seus direitos por meio de ações judiciais.

No caso ora analisado, foi exatamente isso o que aconteceu. Uma família vinculada a uma operadora de saúde nacional através de um “contrato empresarial familiar” (ou seja, aquele que a família utiliza um CNPJ apenas para poder contratar a cobertura médica) recebeu o comunicado de que o seu contrato seria rescindido automaticamente no mês de julho de 2023, e a oferta de receber uma “Carta de Permanência”, para que procurasse outro convênio médico.
A família possui duas crianças atualmente submetidas a terapias por estarem no espectro autista, não podendo parar a realização destes procedimentos, sob pena de se observar uma regressão. E não havia justo motivo para a rescisão, uma vez que o pagamento das mensalidades estava sendo feito regularmente, além de inexistir qualquer tipo de fraude.
A família, contrariada com a posição do plano de saúde, ingressou com uma obrigação de fazer para que o plano de saúde tivesse que manter ativo o contrato de saúde. Ao analisar o caso, a juíza Andrea Duarte Gomes, da Seção B da 31ª Vara Cível do Recife, reconheceu que a conduta do plano de saúde é abusiva:
Por tudo que foi exposto, CONCEDO a tutela de urgência (tutela antecipada incidental), em sintonia com os arts. 294 e 300 do NCPC, determinando que a ré tome, imediatamente, todas as providências necessárias para restabelecer, na modalidade individual, de plano de saúde originalmente contratado em caráter coletivo, com os mesmos valores e benefícios, em favor das Autoras, sem necessidade de novo período de carência. Para a hipótese de descumprimento do preceito, fixo a multa diária em R$ 500,00 (quinhentos reais).
Portanto, a rescisão unilateral do contrato de plano de saúde sem justificativa válida pode ser considerada uma prática abusiva por parte das operadoras, e pode ser contestada judicialmente.

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